segunda-feira, agosto 30, 2010

Coisas pequenas


Não digo coisinhas, não. Coisas pequenas só na sua dimensão física, temporal, tangível, enfim.

Quando há uns dias tropecei neste blogue, aliás, neste post e só depois passei a vasculhar a casa toda, levei uma coronhada na cabeça. Como se no momento exacto em que assaltava aquele espaço, tivesse aparecido a proprietária e zás! Foi de tal maneira, que ainda me vejo dormente e zonza. Pode ser da pancada, mas a verdade é que já não sei se escrevia isto hoje, como escrevi então. Não sei. Ela garante:

«You're going to be just fine. I promise. In fact, you will be better than fine.»

Eu é que não tenho certeza nenhuma.

sábado, agosto 28, 2010

Cá e lá

, estou à mesa do café. Aqui, vou protelando a vida, em lento baloiço, numa cadeira só minha, em casa. Assim foi isto de diário materno a gazeta de vilarejo. Este espaço mudou. Mudou como só podem mudar paredes que são nossas. Nas do café não se mexe, de tão públicas e de ninguém. Gosto do canto só meu, com janelas rasgadas, é certo, mas meu. Pela esplanada vou passando para saber novidades, deixar acenos de bom-dia e boa-noite, ocupar o meu lugar na bancada de todos os arbítrios, desafiar uns e outros para a conversa ou para uma visita a qualquer hora. É… fiquei para aí uns tempos largos à mesa do café, sem voltar a casa – deixei portas por trancar, tudo ao pó, sem nota ao carteiro nem nada. No regresso era já casebre, mas cá está. Vou compondo a quase ruína no intervalo da indolência. A cal deixou-lhe a fachada com outro ar. O resto tem tempo. É bom voltar a casa.

sexta-feira, agosto 27, 2010

Anatomia de uma cesariana

(Clicar para ver a animação)

Os bonequinhos não falam Português, mas a coisa resolve-se. Ei-la, a tradução:


- Olá, doutor. Como está?
- Viva, enfermeira. Estou péssimo. Só fiz 9 buracos por causa desta paciente. Eles estão à minha espera, por isso temos de despachar isto. Está tudo a postos para a cesariana de emergência?
- Sim, doutor, preparei-a há 3 horas, quando o doutor ligou. Ainda bem que chegou.
- Porquê? Que aconteceu?
- Ela começou a ter vontade de fazer força. Por isso pusemo-la a dormir.
- Bolas! Fazer força? Podia ter sido a desgraça. Cheguei mesmo a tempo.
- Só vou precisar é do diagnóstico para reportar à seguradora.
- Não sei. O que podemos dizer hoje?
- Bem… podemos ir para o trabalho de parto não evolutivo.
- Demasiado óbvio.
- E que tal bebé demasiado grande?
- Talvez…
- E demasiado pequeno?
- Essa podia pegar.
- Pois. E a preservação vaginal preventiva?
- Bem, penso que esta senhora sabe ler, temos de fazer a coisa parecer bem.
- Desproporção feto-pélvica?
-Boa! Essa soa muito clínica. Vamos nessa.
- Sim, doutor.
- E o marido vai estar cá para presenciar o milagre do nascimento?
- Não, alistou-se na marinha de guerra.
- Ah, sim? Não sabia. Quer dizer, como havia de saber semelhante coisa?
- Pois. Eu vi no plano de parto dela.
- Leu o plano de parto dela?
- Não. Rasguei um bocadinho para embrulhar e deitar fora a minha pastilha elástica.
- Ahhhhh! Normalmente uso os formulários do consentimento informado para isso.
Bem, fico feliz por saber que estou a apoiar as tropas.
- Como assim?
- Ele vai agradecer-me por manter intacto o seu túnel do amor para a festa de regresso a casa. Ah! Ah! Ah! Ah!
- Ah! Ah! Ah! Ah! Ela tem uma doula.
- Uma quê?
- Uma doula.
-Nunca ouvi falar em semelhante coisa. Haverá algum creme de aplicação tópica para isso?
- Não é urticária. É uma pessoa. Embora seja igualmente irritante.
- E para que serve uma doula?
- Ela queria um parto natural, portanto contratou uma doula para a ajudar.
- Bem, já sabe qual é a minha posição… No que respeita ao parto, o natural é querer medicação. Ah! Ah! Ah! Ah!
- Oh, doutor! O doutor tem muita piada!
- Bom, mãos à obra.
Onde andam os anestesistas?
- Eles vêm já. Querem garantir que ela não aspira o gelo triturado que comeu hoje.
- Desgraçados! Têm noção da urgência crítica que aqui temos? Se não volto lá, tenho de esperar uma semana por nova tacada.
- Vou enviar-lhes mensagem imediatamente.
Entretanto, preciso de alguma informação sobre o acompanhamento pré-natal para o questionário.
- Ok.
- Quando teve ela o seu último parto?
- Não faço ideia.
- Ela tem preferências religiosas.
- Não tenho ideia.
- Ela está à espera de menino ou menina?
- Bem, calculo que ou um, ou outro.
- Ela tenciona amamentar?
- Por que me faz todas essas perguntas pessoais? É para isso que servem os questionários!
- Peço desculpa, doutor.
- Começo assim que conte com a equipa aqui. Vou precisar de ventosa.
- Isto é uma cesariana. Para que precisa disso?
- Ouvi um colega dizer que posso fazer uma incisão mais pequena, se puxar o bebé com a ventosa, e minimizo a cicatriz.
- Uau! Parece fantástico! Há estudos sobre o assunto, a que eu possa aceder?
- Estudos? Não, por Deus! O Jim falou-me nisso quando íamos no quarto buraco. Pareceu-me boa ideia. Por isso, por que não experimentar?
- E há mais, doutor. Ela pede que esperemos que o cordão deixe de pulsar para o cortar.
- Nem pensar! Isso é perigoso!
- A sério?
- Sim! Quanto mais tempo o bebé passar ligado a ela, mais tempo está sob a minha responsabilidade. Essas coisas são imprevisíveis. Deixe o bebé por conta do pediatra.
- Claro, doutor. Ela também queria segurar o bebé logo após o nascimento.
- Porquê? Temos um berçário absolutamente amoroso para os bebés…
Estou tão farto destas mulheres que acham que sabem o que é melhor para elas e para os bebés.
- Acontece que ela é neurocirurgiã.
- Deixe lá isso. Vamos despachar isto antes que o bebé decida sair sozinho.
- Bisturi. Afastadores.
- Vamos lá.
- Então, enfermeira, foi suficientemente indelicada para interromper a partida de golfe do seu médico, quando teve o seu bebé?
- Não, senhor doutor, por Deus! Era lá capaz de uma coisa dessas, quando estive tanto tempo para parir!
- Felizmente alguém me dá ouvidos.
- Sim, senhor doutor, tenho-o ouvido. Foi por isso que pari em casa com uma parteira.

quarta-feira, agosto 25, 2010

Boa Marca

«Que te meta cuatro goles el 'SuperrequeteBarça' en el Camp Nou es una cosa, por mucho que uno claudique en el túnel de vestuarios, pero que te vengan unos brasileños disfrazados de portugueses y te enseñen, uno por uno, los fundamentos de este deporte, es cosa seria.»

Isto diz a Marca, jornal desportivo nuestro hermano, a propósito da vitória do Sporting de Braga sobre o Sevilla Fútbol Club. [Ainda não acredito que me debruço sobre esta bola, mas cá vai.]

A sério? Então e, sabendo disto – das aptidões didácticas dos brasileiros – o senhor Álvarez aprendeu a lição, verdad? Para a próxima, dá a titularidade a mais uns quantos brasileiros, vale? Bem, a uns quantos não dará, uma vez que o plantel só conta com dois – Renato e Fabiano… chatice… Ainda dará para ir às compras, ou tem de esperar pela reabertura do mercado? Seja como for, é sempre possível adiantar trabalhinho de casa: sugiro chicotada já, com a contratação do… sei lá… um brasileiro qualquer. E o olheiro do Sevilla quem é? Não interessa. Fuera! Um brasileiro para o lugar do gajo e que venha de lá com uns vinte mestiços na bagagem! Enquanto o mercado mexe e não mexe, o Navas está fora também – está visto que prata da casa a jogar é má política. E o Palop só não leva já a guia de retorno porque a baliza ficava sem ninguém – o Varas também é castelhano. Azar. Ou melhor: Paciência.

Dê para onde der, com ou sem Paciência, a humildade, o fair-play e o civismo – bom antídoto contra a xenofobia – também podiam entrar no cabaz das novas aquisições, não do clube, mas do senhor que escarrou no teclado semelhante disparate, porque há fundamentos do jornalismo e da convivência social que, definitivamente, não domina.

Bom dia


Isto na sequência da boa noite e por sugestão da Sara.

Boa noite

À noite sou eu, só eu. Pontualmente mãe – se os miúdos ronronam sonhando – ou mulher dele – se o homem da casa marca presença numa lamúria sumida e rápida sobre os membros dormentes. Tudo o resto é silêncio, tudo o resto é meu. Pago com horas de sono estas horas só minhas. Preciso delas. Excepção feita para os primeiros doze meses de parida, as noites são para mim. Queimo-as, consumo-as, derreto-as a meu bel-prazer. É quando o sol me ameaça a azul e roxo que gosto de desistir. Estes dias estão a chegar ao fim. Ninguém me ouviu lamentar o final da praia, mas o fim destas noites… Hoje fico por aqui, não espero pelo sol, que ainda está a três horas de viagem e eu preciso de acertar ponteiros para a semana que vem.

segunda-feira, agosto 23, 2010

Abertura fácil

Ainda sou do tempo em que todo o Tetra Pak garantia “abertura fácil”, quando, chegada a hora da verdade, tínhamos leite, refrigerante ou polpa de tomate por todo o lado, tal era a violência da peleja – um wrestling diário, com o trivial resultado de 3-0 para o pacote. Depois, a garantia de “abertura fácil” começou a desaparecer das embalagens, quando estranhamente estas começaram a tornar-se fáceis de abrir. Nunca mais tive Mimosa, Guloso nem Compal do chão ao tecto – a coisa estava mesmo fácil, embora os Tetra mais duros de roer se mantivessem em circulação.

Da parte do Ministério da Educação, as embalagens continuam a chegar-nos às mãos com a menção “abertura fácil” – para além de expiradas no prazo de validade – e, ano após ano, lá nos vamos confrontando com ECD(1) , TLEBS(2) e EA(3) cuspidos e refractados, maculando-nos chão, paredes e tecto. Estou cansada de andar de esfregona e desgastada por intoxicações sucessivas.

Mas somos resistentes. Para já, o manual de sobrevivência para professores resume-se ao seguinte:



À prudência, mantenhamos o pacote fechado, que nunca se sabe para onde é que a coisa pode espirrar.


(1) Estatuto da Carreira Docente

(2) Terminolgia Linguística para o Ensino Básico e Secundário

(3) Estatuto do Aluno

domingo, agosto 22, 2010

Há feira no feudo

Não sei qual é o espanto. Não é de hoje. O senhor mantém, há muito, portas abertas à feira. O senhor dá licença e toda a bata alva pode entrar, montar banca e chamar a si a clientela que ali alivia a bolsa e os males do corpo. Mas isto dentro de portas, porque ai do afoito que se atreva a assentar arraiais além fronteira!


Desta feita, consta que a caravana mercantil apregoou ao megafone que ia abrir tenda para lá do feudo, depois de ter passado uns dias de canhotos aos portões, à espera de guarida no lado de dentro, mas dos domínios senhoriais nem pio, não chegou sequer um “Quem devo anunciar?”. Nada. Posto isto, esticaram-se as lonas, cravaram-se as estacas e a barraca lá deu início ao serviço, do lado de fora, onde já alguém montara também estaminé discreto – coisa sem estandartes ou tabuleta à porta, nem metal cunhado em circulação, não fosse o senhor enfurecer-se com a afronta.




Quem nunca teve segundas opiniões médicas baseadas exclusivamente em relatórios laboratoriais ou de imagiologia, na ausência do utente a que diziam respeito? Ainda há quatro meses ouvi eu: “Sim, estes valores são perfeitamente compatíveis com um quadro de pneumonia grave” – isto de olhos num relatório de análises clínicas e outro de uma TAC, sem a presença do doente, porque o que me interessava era dar cumprimento à burocracia que nos obriga à chancela do Serviço Nacional de Saúde em caso de baixa médica. Ora, neste caso em concreto, que esperar do médico do Centro de Saúde senão uma segunda opinião de papel, sem passar pela observação do doente, acamado em casa por determinação de um seu colega do sector privado? Devo dizer que esta opinião do médico-secretário representou para mim um benefício incalculável, se atendermos ao facto de que a alternativa à pneumonia era o carcinoma pulmonar. Bendita segunda opinião. Levei dias de agonia infindável enquanto não me chegou aos ouvidos. É verdade que me ficou ao preço de uma taxa moderadora – dois euros e tal – mas não seria de esperar a inflação escandalosa deste valor se recorresse a um serviço privado? O que choca então a Ordem dos Médicos, desta vez? A inovação do serviço online? Que inovação? Não saberão, porventura, que esta forma de ajuda ao utente já existe há anos? Há anos que médicos, dos sectores público e privado, prestam esclarecimentos sobre situações clínicas concretas, sem no entanto fazerem diagnóstico ou qualquer referência terapêutica online. E o serviço Saúde 24, de tanta utilidade nos dias que correm, não procede à triagem de situações clínicas, exemplarmente cumprida por enfermeiros, à distância de um telefonema? Até quando vai a nossa Ordem dos Médicos relegar-se para o plano da reacção – sempre em diferido, a reboque dos acontecimentos – em lugar de passar à acção?




Que não se escandalize quem trouxe a feira ao feudo se um dia se instalarem os feudos na feira.

sexta-feira, agosto 20, 2010

Sem tempo

Levanto-me sem tempo, vivo sem rotina, tudo sem medida. De manhã não sei que dia é. Que ando algures entre a segunda e a sexta é tudo o que posso garantir, é tudo o que me garante o lado esquerdo vazio - o da cama, só o da cama, porque ele volta, ao fim do dia, e finge que a jornada nem foi de labuta aflitiva, cúmplice no anacronismo que me sabe bem. Hoje perguntei-lhe: "Amanhã que dia é?". Sorriu e preencheu-me todo o lado esquerdo, o direito e o avesso, sem tempo.

quinta-feira, agosto 19, 2010

O futuro da memória

É muito interessante vasculhar jornais velhos. Hoje então - prescindindo da hemeroteca e tudo, para escarafunchar o mofo - é sempre em auto-estrada que chegamos ao pretérito, este mais que imperfeito.

Aos 19 dias do mês de Agosto, do ano 2010, quando "ao segundo sinal serão 3 horas, 15 minutos e três segundos" - piiiiii, piiiiiii - ainda não existe CMI do Norte, a sua construção não teve sequer início, porque o respectivo projecto não conseguiu ainda aprovação. Pior: o cidadão comum não consegue sequer entender, ao fim de dois anos, afinal com que serviços o brindará semelhante empreitada.

Vamos esperar pelo pós-guerra... Mas vão guardando os jornais.

terça-feira, agosto 17, 2010

Pluralismo de pacotilha




E refinado. O lápis, azul e anacrónico, converteu-se num rato, ávido de cliques sobre o ícone "eliminar", ou "delete". É poliglota, mas lida muito mal com o pluralismo.

Constato, sem surpresa, que o meio virtual, de blogues e redes sociais, está pejado de ratos.

segunda-feira, agosto 16, 2010

Fora-da-lei

Este blogue não aplica, nem aplicará em tempo algum, o desacordo ortográfico.

7 dias, 7 ofícios

Leio perplexa a resenha de equívocos com que a APDC pretende manter-nos a todos equivocados. Perplexa entre a hipocrisia, a ignorância, o conservadorismo e o paternalismo serôdio. Não sei mesmo qual dos quatro terá mais peso. De uma coisa estou certa: estes são argumentos que só podem vir da cabeça de homens incapazes daquela assombrosa competência de que são investidas todas as mulheres assim que a maternidade as consome em cuidados permanentes – falo da consecução de duas, três e quatro tarefas em simultâneo, SETE dias por semana, sem tréguas caprichosas que lhes poupem na agenda um domingo ou feriado, porque todo o dia é dia, e se a sesta do filho coincidir com a melhor hora para ir às compras justamente no domingo, pois será mesmo no Dia do Senhor que a senhora da casa vai ao hipermercado, enquanto o senhor fica com as crianças. Compras no hipermercado em dias úteis?! A que horas?! Úteis, mas não tanto… Saberá a APDC entre que horas se estende a rotina laboral e escolar da maioria dos agregados familiares portugueses? É que a ideia de sairmos de casa às cinco da manhã ou às onze da noite para uma gincana de carrinho de compras não me parece muito razoável nem exequível…

Terá a APDC entendido, a este propósito, que era agora ou nunca – que não podia deixar passar a oportunidade de fazer justiça à sigla e resolveu tomar para si as dores de todo o consumidor português, usurpando-lhe a agenda e a contabilidade domésticas? - “Ai, ai, ai, ai ai! Qu’é lá isso? A torrar euros ao domingo à tarde, no consumo cavalar, com a prestação da casa em atraso e o condomínio por pagar? Acabou-se o domingo agarrado ao carrinho! E se não entras nos eixos, ficas só com a segunda-feira, das 9h00 às 10h00 e das 15h00 às 16h00, para ires às compras gastar as senhas que a amiga APDC entrega no domicílio à sexta à tarde!”

“A questão é fracturante”. Pois claro que é fracturante. Quantos haverá que não têm a minha vida? Reformados, desempregados, abonados que nasceram com o rabinho virado para a lua… esses poderão sempre ir abastecer a despensa à terça, lá pelas 10h00, ou não a abastecem sequer, feliz ou infelizmente… Lojas de conveniência? Comércio electrónico? Ora aí está o que é. Escapava-me. Pois claro: a classe média e média-alta das grandes áreas metropolitanas abastece sentadinha diante do monitor, paga taxas de entrega e sujeita-se aos preços agravados pela inconveniência de recorrer à loja de conveniência a horas e dias menos próprios; os restantes, aspirantes a consumidores de pleno direito, esperam pela segunda-feira ou que o feriado passe, e para a próxima já aprenderam que desopilar ou ocupar-se de si e dos seus ao sábado ou ao domingo de manhã tem os seus custos, e que quem diz quando a hora é de ócio ou de labuta é a APDC, a ACOP, a Conferência Episcopal Portuguesa, a Confederação do Comércio e Serviços de Portugal, a Associação de Comerciantes do Porto, a UGT, o Sindicato dos Trabalhadores do Comércio e Serviços de Portugal, entre outros, que não o consumidor.

Quanto ao comércio tradicional, lamento por quem perdeu o comboio e não se soube afirmar no mercado como mais-valia de carácter distintivo em relação à área do retalho nas grandes superfícies. Se, num domingo à tarde, topar com as portas do hipermercado fechadas, não me resta alternativa senão o transtorno de lá voltar na segunda-feira. O comércio tradicional não se constitui nunca como alternativa, neste caso. No entanto, se quiser comprar determinado produto ou serviço que só aquela lojinha de esquina tem para mim, com toda a certeza arranjo uns minutos para dar lá um salto e lá voltarei uma, duas, duzentas vezes, enquanto me reservar o que mais ninguém tem, servido como mais ninguém sabe, pela mão de quem trato pelo nome.

domingo, agosto 15, 2010

Crónica

A dificuldade em manter-me como mera espectadora, enquanto a vida pinga, escoa e corre, lá fora e cá dentro.

Para que conste, este blogue não esteve sequer enfermo. Manteve-se vivo ao longo de mais de um ano, em reflexões mudas, que não chegavam ao teclado nem sei bem porquê. Não, não vegetou. Viveu, de facto. Viveu e cresceu, de tal modo que, passando em revista o que ficou para trás, asseguro que há por aqui desabafos e devaneios que considero hoje descabidos, ridículos, fúteis, ocos, exemplares únicos do que é o kitsch de linguagem, marcado por tiques de expressão recorrentes. Antes o aparente desprezo a que votei este espaço, do que a verborreia que - essa, sim - o debilita e condena. Nem tudo o que mexe está vivo, nem tudo o que parece imóvel carece de vitalidade.

Mas hoje quis voltar. Preciso de voltar. Isto porque "ter opinião formada" não chega. Acumular experiências de vida, como quem junta mais um cromo à caderneta, deixa-me incompleta e em dívida. Ao longo deste último ano senti muitas vezes necessidade de deixar escrito, afirmar e partilhar por meio do teclado posições pessoais e episódios de vida. Posto isto, eis que a saudade e ânsia levantam fervura e me trazem de regresso. Não foi fácil, ou não estivesse o ponto de fusão da minha inércia muito para lá dos 100 graus centígrados.

Sem garantias, porque tão crónica é a ânsia quanto a inércia.

5º mandamento

Aplicado também a este blogue. Eu sempre disse que não te mataria.