A propósito deste post e do comentário que tive de fazer, não pude deixar de rir recordando o dia em que ela foi pela primeira vez vítima da ira de um colega. A educadora escreveu na caderneta: "A R. sofreu um pequeno acidente. Um colega atirou-lhe com um brinquedo à cabeça e fez-lhe um pequeno golpe. O arranhão foi prontamente desinfectado com betadine." Sim, senhora. A mãe não panicou, até porque, observando a cabeça da miúda, não vislumbrava nem um vermelhãozinho que fosse, por baixo dos caracóis. E conforme hoje é vítima, amanhã - quem sabe?- é agressora. Tudo bem. Faz parte. Menos benigna e muito mal intencionada, confesso, foi a ideia que imediatamente me passou pela cabeça: vamos provocar o paizinho! YES! Toca de vasculhar a carteira - que engorda a olhos visto e a esta altura parece mais uma mala de porão- e telemóvel em punho. Percorro a grande velocidade os menus disponíveis até às mensagens. Começo a teclar: "Venho fazer queixas, papá: 1 menino deu-me c/ 1 brinquedo na pinhinha e fez 1 ferida q a R. teve de tratar c/ betadine...~". Bom, a resposta, como malevolamente previ, não se fez esperar. O que não fui capaz de prever foi o extremo a que pode chegar o zelo de um pai-leão. Rezava assim o sms de resposta: "O paizinho vai-lhe dar com um brinquedo na mona tb. Mas o paizinho gosta de brincar com machados...*na pinhinha e~" À parte o private code que põe termo à ameaça, compreendem a transmutação a que está sujeita a natureza humana, quando o que está em causa é a defesa da prole, não é?... Acreditem! Ele não é nada assim! A verdade é que o pacifismo é a palavra de ordem cá em casa! Espero que me tolerem este momento de humor um bocadinho menos que negro, mas não resisti... Tinha mesmo de contar.
sexta-feira, março 31, 2006
quarta-feira, março 29, 2006
Estou grávida...
...Há dois anos. Calma! Calma com os entusiasmos! Enganei-vos, pois claro. Estou para aqui a rir enquanto escrevo imaginando as reacções ao título. O pai da casa até é capaz de ter tombado sobre o teclado se resolveu espreitar o "vlog" lá na empresa. Bom, a páginas tantas, já não sei quem é que anda ao engano... O caso é simples: à minha caixa de correio electrónico continua a chegar, há já dois anos, um e-mail semanal intitulado Pregnancy without problems e um outro, ainda mais insólito, denominado Your pregnancy this week. Lá vou apagando os ditos mails, sempre com um grito: "JÁ NASCEU!!!" Irra! Ainda que fosse cria de hipopótamo, já cá estaria há muito tempo!
Não estou, mas já estive
E a propósito de umas barrigas que circulam por aí e que me deixam azul de inveja, aqui deixo as evidências que comprovam o que foi a minha "casinha de bonecas" - sim, que eu nunca tive um T0 sequer! - ou melhor será chamar a "casinha da boneca", linda bonequinha, por sinal.
Ora vamos lá a adivinhar quanto tempo de inquilina tinha a minha bonequinha nesta altura... Imaginam?
domingo, março 26, 2006
Ó da guarda!!!
Acudam! Apanhem o bandido que me roubou uma hora de sono este fim-de-semana!
E com todo o desplante chamam-lhe "hora de Verão", a ver se me seduzem... Quero lá saber do Verão! Já disse: têm dez minutos - eu disse DEZ - para me devolverem a minha horinha de Inverno! Depressa!
Querem fazer o favor...
... De não concordar com tudo o que digo?! Façam, por exemplo, como o Sr. Dr.! Tem muito mais graça!
quinta-feira, março 23, 2006
VERGONHA! VERGONHA! VERGONHA! VERGONHA! VERGONHA! VERGONHA! VERGONHA! VERGONHA! VERGONHA!
À saída do hipermercado, vinha com um pacote de biscoitos para cão dentro do casaco. Eu juro que não vi nada! Eu juro que não sei como fez ela aquilo! Eu juro que a educo dentro dos melhores princípios! Acreditam, não acreditam?
Por outro lado, pergunto-me se esta paixão por tudo o que tem focinho, bico ou barbatanas não estará a ir longe demais...
quarta-feira, março 22, 2006
Na cama com...
Os pais, o gato, o cão, o ursinho, a fralda, seis chuchas, a camisa da mãe... o que tiver de ser. Perdi os preconceitos nesta matéria. Para tanto bastou parir uma filha e ler um livro. Sei que não vai faltar quem apareça a rebater as minhas palavras - e atenção que eu disse palavras, não disse teoria, não venho teorizar, tudo o que aqui ficar dito teve e tem concretização real. Para quem não entendeu ainda, ou não tem a certeza de ter entendido, esclareço, preto no branco: venho, sim, senhor, defender a partilha da nossa cama com as nossas crianças. O.K. Já estou a imaginar as primeiras reacções de alguns dos que me lêem: "pois... esta já conseguiu estragar a filha e agora procura companhia na desgraça..." Não. Para que fique claro, também: ela deita-se, invariavelmente, por volta das 21h30 (na cama dela) e só acorda, ritualmente, por volta das 08h00 (na cama dela). Mas uma coisa ela tem garantida desde sempre - quer dizer... desde que li o livro - basta dar sinal e a nossa cama é dos três. E a verdade é que tem noites muito melhores desde que assim é. E a verdade é que é assim desde os seus seis meses, embora ela fizesse noites seguidas de sono desde os dois meses, talvez... Simplesmente, assim que percebeu que podia baixar a guarda ao longo da noite, porque a nossa protecção estava garantida, passou a dormir com outra serenidade, que transparece na sua expressão. Ela passou a ter a garantia de que a atendíamos sempre, de que não estávamos à espera que fechasse os olhos para fugirmos, de que não seria traída pelo peso dos olhos e transferida para outra cama a meio da noite. Por outro lado, nunca nos passou pela cabeça pô-la a dormir se não estivesse realmente cansada e com sono, foi ela que foi ao encontro do relógio e nunca sentiu a ameaça dos ponteiros. Ainda hoje nos perguntamos, todas as noites, quando se aproxima a hora: "Achas que já está pronta? " E a resposta tem de ser "Sim", caso contrário, volta aos livros, às torres de Mega Blocks, aos beijos roubados, às turras de mimo... Como se falássemos de um parto, respeitamos meticulosamente cada uma das fases da passagem da vigília ao sono, sem saltar nenhuma, sem precipitações, porque também num parto não passaria pela ideia de ninguém mandar fazer força a quem não chegou sequer a experimentar uma contracção.
Até agora, fiz-me entender, não é verdade? Ninguém tem dúvidas de que ela é um exemplo de disciplina no que toca a hábitos de sono (e não só, mas isso dá outro post...)? Vamos então à cama dos pais. A necessidade, sublinho NECESSIDADE, do ser humano dormir acompanhado é genética e perde-se na memória dos tempos. Nos primórdios da Humanidade, dormir sozinho era sinónimo de extinção. Dormir com outros garantia-nos a sobrevivência. Quem dormia sozinho estava mais vulnerável e sucumbia às garras de qualquer fera e à lei do mais forte, que no caso era sempre aquele que tinha inteligência suficiente para não cometer o erro de adormecer sozinho. Ora, não é novidade para ninguém - qualquer pai ou mãe mais atento o terá já constatado - que as crianças conservam o que de mais instintivo há no Homem. É justamente o instinto de defesa e sobrevivência que obriga um bebé a chorar ao longo da noite. Se assim não fosse, a mãe corria o risco de adormecer por demasiado tempo sem o alimentar, ou de chegar já tarde, quando um predador mais atento desse com a cria. Claro que existem crianças que nunca choram, mas essas, noutros tempos, estariam condenadas à partida, não teriam grandes hipóteses de atingir um ano de idade. Digamos que os "chorões" estão geneticamente melhor apetrechados para sobreviver. Colmatadas as necessidades de alimento e higiene, resta a necessidade de protecção pessoal, que a criança procura garantir acordando de vez em quando, para se assegurar de que estão a olhar por ela. A partir daqui, o ciclo pode seguir duas vias distintas: ou a criança constata que a sua segurança está idubitavelmente garantida e começa a acordar cada vez com menos frequência, porque consegue serenar o espírito; ou verifica repetidamente que não está protegida, que foi enganada numa segurança ilusória, e começa a acordar cada vez com mais frequência, a exigir atenção constante e a reivindicar abusivamente a cama dos pais, como forma de se certificar da sua própria segurança. Aquela teoria, defendida por muitos, de que o bebé pode ser embalado, mas deve ser deitado na sua cama ainda acordado, para não estranhar o espaço quando voltar a acordar a meio da noite, está certa na forma de operacionalização, mas não no seu fundamento. Quer dizer: sou de opinião de que o bebé deve de facto ser deitado na sua cama ainda acordado, mas não por uma questão de reconhecimento espacial. O que acontece é que, quando fazemos isto, estamos a dizer à criança: "Vês? Ficas aqui e estás segura. Não te quero enganar." Acontece que isto só pode ser feito quando o bebé já entendeu que não corre riscos e pode confiar no nosso socorro intantâneo sempre que necessário. O êxito neste processo de aprendizagem da confiança, faz das crianças seres mais independentes, empreendedores, ao contrário do que defendem muitos. Uma criança constantemente traída na sua confiança torna-se receosa, isso sim!
Demasiada teoria, para quem disse que não vinha teorizar, não? Mas a teoria não é minha. É do pediatra Carlos González, que em boa hora escreveu o livro Bésame Mucho. Como Criar os Seus Filhos com Amor. Uma verdadeira bíblia para os pais!
Eu posso assegurar: a minha filha teve a cama dos pais sempre que quis ( e tem querido algumas vezes, todas justificadíssimas por doença, sonhos maus, rotina diária transtornada...); no entanto, continua a sorrir ao seu colchão, lençóis e edredon quando o relógio marca as 21h30. Daí para a frente é só "Até amanhã...", com dois beijos e uma visita tardia ao quarto, só para a vermos dormir e para afugentar algum lobo mau...
Agora batam-me, vá. Não me importo.
terça-feira, março 21, 2006
E no Dia Mundial da Poesia...
... O poema que foi sempre a minha bandeira enquanto filha, mas que ainda não estou preparada para ouvir como mãe... Não vais declamá-lo tão cedo, pois não, miúda? Diz-me que não... Preciso de tempo... Muito? Muito...
Poema à Mãe
No mais fundo de ti,
eu sei que traí, mãe.
Tudo porque já não sou
o menino adormecido
no fundo dos teus olhos.
Tudo porque tu ignoras
que há leitos onde o frio não se demora
e noites rumorosas de águas matinais.
Por isso, às vezes, as palavras que te digo
são duras, mãe,
e o nosso amor é infeliz.
Tudo porque perdi as rosas brancas
que apertava junto ao coração
no retrato da moldura.
Se soubesses como ainda amo as rosas,
talvez não enchesses as horas de pesadelos.
Mas tu esqueceste muita coisa;
esqueceste que as minhas pernas cresceram,
que todo o meu corpo cresceu,
e até o meu coração
ficou enorme, mãe!
Olha - queres ouvir-me? -
às vezes ainda sou o menino
que adormeceu nos teus olhos;
ainda aperto contra o coração
rosas tão brancas
como as que tens na moldura;
ainda oiço a tua voz:
Era uma vez uma princesa
no meio de um laranjal...
Mas - tu sabes - a noite é enorme,
e todo o meu corpo cresceu.
Eu saí da moldura,
dei às aves os meus olhos a beber.
Não me esqueci de nada, mãe.
Guardo a tua voz dentro de mim.
E deixo-te as rosas.
Boa noite. Eu vou com as aves.
eu sei que traí, mãe.
Tudo porque já não sou
o menino adormecido
no fundo dos teus olhos.
Tudo porque tu ignoras
que há leitos onde o frio não se demora
e noites rumorosas de águas matinais.
Por isso, às vezes, as palavras que te digo
são duras, mãe,
e o nosso amor é infeliz.
Tudo porque perdi as rosas brancas
que apertava junto ao coração
no retrato da moldura.
Se soubesses como ainda amo as rosas,
talvez não enchesses as horas de pesadelos.
Mas tu esqueceste muita coisa;
esqueceste que as minhas pernas cresceram,
que todo o meu corpo cresceu,
e até o meu coração
ficou enorme, mãe!
Olha - queres ouvir-me? -
às vezes ainda sou o menino
que adormeceu nos teus olhos;
ainda aperto contra o coração
rosas tão brancas
como as que tens na moldura;
ainda oiço a tua voz:
Era uma vez uma princesa
no meio de um laranjal...
Mas - tu sabes - a noite é enorme,
e todo o meu corpo cresceu.
Eu saí da moldura,
dei às aves os meus olhos a beber.
Não me esqueci de nada, mãe.
Guardo a tua voz dentro de mim.
E deixo-te as rosas.
Boa noite. Eu vou com as aves.
Eugénio de Andrade
in Os Amantes Sem Dinheiro (1950)
in Os Amantes Sem Dinheiro (1950)
NOTA: O blogger dá comigo em doida! Não consigo apresentar devidamente o poema! Não dá para formar estrofes! Enfim... Desculpem-me. Que me desculpe o magno poeta.
NOTA 2: Agora sim! Está já como sempre deveria ter estado! Não fui eu! Foi a Dona Redondinha. Obrigada!
domingo, março 19, 2006
Tiffosi
Não, não estão a ver a minha cadeirinha de refeição, é o meu cockpit mesmo. Nã, nã, nã, não é a Pirralhita que aqui está, é o Schumi, ele próprio (de cabelo mais claro e olhinhos mais azuis, mas isso não interessa). Não, não estão com problemas de vista, nem estou a tentar ocultar a minha identidade, só não me autorizaram a ida às boxes e o resultado, em pleno andamento, foi este, um bocadinho difuso. Não, não me dá esta maluqueira todos os domingos, só hoje, que é dia do pai.
Beijo, pai!
PAI
quinta-feira, março 16, 2006
Bibliodevoradora
Sim, inventei. A palavra não existe. Mas posso explicar como nasceu o neologismo. Explicar, não. Vou mostrar. Conseguem ver a falha de coloração a meio do livro, junto à margem direita? Não, não é problema tipográfico. Não é uma mera falha de coloração. É uma dentada a sério. Com mais atenção é mesmo possível reconhecer o recorte de quatro incisivos e dois caninos. Este quero guardar para a posteridade, para contar um dia à minha devoradora de livros como foram os primeiros anos deste amor pelas páginas encadernadas. Devora livros, em sentido literal e figurado. É a primeira coisa que faz de manhã: agarrar-se a eles, folheá-los com uma ansiedade semelhante à de Gama chegando à Índia, e suplicar que lhe descrevamos as imagens que ela vai apontando. Por vezes, o insólito acontece: o amor puramente platónico, esta bibliofilia, deixa de satisfazer e torna-se físico, carinhosamente revelado à dentada. Qual será, amanhã, o "prato do dia"?
O post que se impõe
Obrigada. Aos que leram e comentaram, e aos que leram e, não comentando, entenderam.
sexta-feira, março 10, 2006
A S., hoje, não foi à aula. "Perdemo-la" no início da semana. Não consigo alternativa ao eufemismo "perdemo-la". Até porque o verbo perder traduz melhor o estado de desamparo em que a sua ausência nos deixa.
"Devagarinho, S.zinha! Devagar!" foram as palavras que mais vezes lhe repeti. Mas a minha menina, embora limitada nos seus movimentos, insistia na pressa. Afinal não era pressa de chegar, era pressa de viver, porque foi realmente curto o seu tempo. Para mim, isto agora é claríssimo, mas só agora - é claro que um temporizador limitado a 17 anos só pode impor-nos pressa, muita.
Se pudesse, apagava esta semana do meu calendário e passava a repetir: "Corre, S.zinha! Corre!" Mas agora é tarde...
Espera por mim, querida, que um dia acabamos a ficha que ficou a meio.
A professora que passa a recordar-te em cada aula que voltar a dar na vida.
quarta-feira, março 08, 2006
segunda-feira, março 06, 2006
Boa, Google!
Dei por mim, já cheia de sono, a trautear uma canção que adorava em miúda. Só o início saía fluente, ao terceiro verso empancava. Ainda recomecei, a ver se fintava o nevoeiro da memória, mas não, era escusado. Que pena... pena mesmo. O que eu gostava da canção!... Espera! Parece doidice, mas não custa tentar. Precipitei-me para o teclado: http://www.google.com No campo de pesquisa arrisquei: "indiozinho estava a chorar". E... Ahhhhhh! Boa, google! Boa!
O indiozinho estava a chorar,
sem um cavalo para montar,
foi para o prado ao pé do rio,
viu um cavalo cheio de frio.
O cavalinho estava a tremer,
o indiozinho deu-lhe de comer,
fez-lhe festinhas foi p'ro pé dele,
trouxe uma manta dormiu com ele.
No outro dia partem os dois,
ficam amigos sempre e depois,
o cavalinho galopa bem,
gosta do dono qu'agora tem.
O post não podia ser mais naif, eu sei, mas soube tão bem este despertar da memória...
A mãe amanhã canta, filha.
quarta-feira, março 01, 2006
Elogio da estupidez
A fazer fé na publicidade, o primeiro lugar no pódio da inteligência ia para um esquentador. Tudo porque o "bicho" liga e desliga com a abertura e fecho das torneiras de água quente. Quer dizer: anda para aí tão boa gente de canudo, mestrado, e doutoramento, abertos e fechados a tanto custo numa Sorbonne ou numa University of Massachusetts , para vir depois um qualquer esquentador tomar-lhe os predicados! Pois eu venho decidida a denegrir a imagem do presunçoso electrodoméstico e não é por me fazer sombra ao canudo, não! É mais por me ter deixado, dias a fio, de pele, cabelo e dentes arrepiados, com doze quilos de peso à anca, enquanto enchia, aquecia e vertia chaleiras de água a ferver na banheira da Pirralha! A verdade é que o desgraçado, o ESTÚPIDO - é bom que se diga! - me deixou sem água quente! E não foi a primeira vez - as manifestações de estupidez começaram ainda em Janeiro, mas nessa altura, como se recompos, eu resolvi dar-lhe o benefício da dúvida... Afinal de contas, todos temos direito aos nossos acessos de estupidez... Ora, daqui tirei a primeira lição: há que saber distinguir um caso crónico de um caso agudo, e ao primeiro o melhor é não dar grandes hipóteses de remissão. Eu dei e fiz mal. Não entendi à primeira que a "inteligência" do meu esquentador era um falso atributo, argumento publicitário obviamente enganoso, mera utilidade electromecânica de falibilidade altamente provável. Pois... ninguém tem culpa de nascer estúpido e o meu esquentador também não teve. A quem tenho de apontar o dedo é à publicidade que me convenceu do contrário, que me fez acreditar na inteligência de um esquentador, preparado para responder na perfeição às ordens das torneiras de pintinha vermelha - sabe as cores, é ecológico, económico e seguro! Tão inteligente que ele é! Era! E eu que estúpida que sou! Fui! Acabou! Tragam-me um esquentador estúpido! Quanto mais estúpido melhor - daqueles que não sabem as cores, não entendem nada de ecologia, não fazem contas aos euros, mas sabem aquecer água! É mesmo só isso que sabem fazer. É mesmo só isso que se quer.
Chamámos o técnico. Daqueles que se fazem pagar melhor que qualquer especialidade médica. Nem pensar em novo conserto. Não queríamos nem sequer ouvir falar de diagnóstico. Queríamos lá saber se era de novo o hidrogerador, a conduta de saída de gases de combustão, ou a variação de pressão na rede de abastecimento! O prognóstico é que estava feito à partida: Lixo com ele! Sim, senhora, que tínhamos toda a razão, que o melhor era jogar pelo seguro e não valia a pena enterrar mais dinheiro. A coisa resolveu-se num abrir e fechar de olhos, ou melhor será dizer num descer e subir de pés para cima da minha bancada de cozinha, aquela onde assento os bifes, pico salsa, sirvo sopas e descanso a colher de pau que mexe o arroz! Mas para que me pediu ele o escadote??!! Apeteceu-me insultá-lo de tudo o que há de pior, e, assim de repente, não me ocorria nada pior do que a apóstrofe "esquentador de última geração". Era isso mesmo que me apetecia chamar-lhe! Mas não foi preciso. Deve ter percebido pela minha cara que estava à beirinha de uma apoplexia e tratou de remediar o caso muito ligeirinho: toca de pegar no meu paninho amarelo, aquele que está junto à louça lavada e tem por única função absorver a água que me vai encharcando a bancada (a tal dos bifes, da salsa, da sopa, da colher de pau...) e ... zumba, zumba, zumba, zumba - "limpa-me" em 3 segundos o espaço onde tinha posto os pés e, não satisfeito, pega num tupperware imaculado que eu tinha a escorrer e recolhe lá dentro todo o lixo que foi juntando, como se me fizesse um grande favor. Balanço da operação: uma hora e meia a lavar freneticamente, com lixívia e trejeitos de esquizofrénica, cada milímetro quadrado onde supunha que o infeliz pudesse ter tocado. Enquanto esfregava os azulejos e a consciência, perguntava-me: Para que ensino eu Os Lusíadas a esta gente? Amanhã vou pregar o episódio do Consílio dos Deuses ao meu esquentador que, vá-se lá saber porquê, é de novo inteligente...
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